20.2.2024

Um SUS mais justo e universal pode salvar muita gente em relação à mudança climática, diz especialista da Fiocruz

De acordo com o pesquisador Christovam Barcellos, a relação entre saúde e alterações no clima é inegável

Escrito por
Sabrina Brito
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Retrato do pesquisador da Fiocruz Christovam Barcellos
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Acervo pessoal
Christovam Barcellos trabalhou como sanitarista das secretarias estaduais de saúde do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul

Chistovam Barcellos é pesquisador titular do Laboratório de Informação em Saúde do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Lis/Icict) da Fiocruz. Segundo o especialista, diversos problemas de saúde podem ser observados em decorrência da mudança climática, dois fatores que estão intimamente ligados.

Barcellos também participa de estudos, a exemplo daquele que revelou que o voto no ex-presidente Jair Bolsonaro influenciou os índices de óbitos por coronavírus registrados pelo país. Trabalhou, ainda, como sanitarista das secretarias estaduais de saúde do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

O pesquisador foi homenageado durante a 17ª edição da Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Prevenção e Controle de Doenças (ExpoEpi), realizada em Brasília no ano de 2023, “pela sua relevante contribuição para o desenvolvimento das ações de epidemiologia, prevenção e controle de doenças no país”.

Leia, a seguir, a entrevista com Barcellos:

Existe uma ligação entre mudança climática e saúde? Com certeza. Mais recentemente, no século XX, começou-se a fazer relações entre a mudança climática e seus impactos na saúde. Doenças transmitidas por vetores, por exemplo, os quais dependem de determinado clima para encontrarem sucesso, necessitam de condições climáticas mais favoráveis, como calor ou umidade. Em regiões mais frias, quase não existe transmissão de dengue, por exemplo. 

Quais outras questões de saúde podem emergir com a mudança climática? Um importante grupo de problemas de saúde está ligado a ondas de calor, que temos visto cada vez mais na Europa, Estados Unidos e Brasil. Elas podem causar o agravamento de doenças pré-existentes ou até a morte, devido ao chamado estresse térmico. Teremos que tomar cada vez mais cuidado com esse tipo de coisa.

As pessoas estão igualmente suscetíveis à mudança climática? Não. Populações mais expostas a agentes químicos tóxicos, a água poluída, que têm contato com esgoto ou com animais que transmitem doenças, podem se beneficiar muito de um modelo econômico mais favorável, que reduza a poluição, por exemplo.

Como minimizar as consequências da mudança climática? Existem algumas medidas que podem ser tomadas para mitigar os efeitos da mudança climática. A mais óbvia é a redução da emissão de gases de efeito estufa, o que é bastante complicado, já que a grande maioria de nós usa derivados de petróleo no dia a dia, a exemplo dos plásticos e dos combustíveis. Precisamos também de energia para sobreviver no mundo que criamos. 

E as mudanças referentes à forma como consumimos? Alterar padrões de consumo é bastante difícil, e exige tecnologias novas e adaptações a uma nova economia. Isso depende de indústrias e empresas também, além do setor agropecuário. Outro grupo de alterações são as medidas de adaptação. Pessoas que habitam locais que protejam contra ondas de calor, vivem em regiões arborizadas e com boas condições de saneamento sofrem menos impacto das mudanças climáticas. Quem mora em grandes aglomerados sem áreas públicas arborizadas ou saneamento sofrerá mais. Isso é ainda mais verdade quando se fala de áreas sem acesso a sistemas públicos de saúde, como o SUS. 

Como o SUS pode ajudar? Esse tipo de serviço é uma forma de proteger a população mais vulnerável contra a mudança climática. Um SUS mais justo e universal pode salvar muita gente nesse sentido, seja na ocorrência de ondas de calor ou no tratamento e prevenção de doenças transmissíveis por vetores que encontram maior sucesso devido à mudança climática, como a dengue ou a malária

Qual o papel do SUS no contexto da mudança climática? A saúde costuma ser o setor que paga as contas da mudança climática. Qualquer enchente, qualquer surto de doenças ligadas ao aquecimento global, recai sobre esse setor em forma de prejuízo. A saúde não pode ser apenas o final dessa equação. Ela deve também fazer parte da solução. Pesquisadores e profissionais do ramo percebem quem são as pessoas afetadas, por exemplo, por ondas de calor ou pela contaminação da água. A partir daí, podem ser elaboradas diversas políticas públicas. O SUS é um sistema de saúde projetado para ser universal, equânime e descentralizado, bem distribuído. Se reforçarmos a estrutura desse sistema, salvaremos muitas vidas. O que acontece é que, no final das contas, esse sistema é subfinanciado, não está em todos os lugares, entre outros diversos problemas. Sabemos que seus recursos devem ser mais bem utilizados, de forma a otimizar o atendimento.

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Sabrina Brito
Sabrina Brito
Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP
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