26.3.2024

Para enfrentar o calor extremo, soluções de arquitetura promovem adaptação à mudança do clima

De acordo com especialistas, o papel da arquitetura é importante para a manutenção do conforto térmico

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Sabrina Brito
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Marc-Olivier Jodoin/ Unsplash
Com o aumento do calor, novas construções precisarão de medidas para aliviar as temperaturas

Enquanto lideranças globais discutem formas de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, ondas de calor já são mais frequentes e afetam o dia a dia da população.  Devido às temperaturas extremas, o número de unidades de ar-condicionado no planeta deve triplicar até 2050. Contudo, esses equipamentos também são poluentes e contribuem com o aquecimento global. Para enfrentar a mudança do clima, soluções de arquitetura que garantem o conforto térmico em diferentes condições são essenciais. 

De acordo com os cenários futuros de aquecimento do planeta apresentados no Sexto Relatório de Avaliação das Mudanças Climáticas (AR6) do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), a previsão de aumento médio das temperaturas globais é de 1,0°C a 5,7°C até o ano de 2100. 

Segundo a engenheira e doutora em conforto ambiental pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Luciane Durante, será necessária uma grande demanda no consumo de eletricidade para manter as condições e o conforto ideais nos edifícios, inclusive para que as pessoas possam continuar a trabalhar neles. “Nesse sentido, estratégias de adaptação das edificações focadas na redução dos efeitos do aquecimento global são de fundamental importância, visando o enfrentamento das mudanças climáticas”, disse.

O mesmo desafio se repete mundo afora e diversos países buscam alternativas para enfrentar a mudança do clima. Um exemplo é Burkina Faso, na África ocidental. Apesar de as temperaturas subirem para a faixa dos 40ºC, algumas escolas e orfanatos do país se mantêm perfeitamente amenos. 

É o caso do orfanato Noomdo, onde o uso de placas de metal para proteger o telhado da luz do sol e da chuva ajuda a deixar o espaço habitável em termos de temperatura. Além disso, a construção também permite que o ar quente saia, contribuindo ainda mais para o chamado conforto térmico, condição na qual uma pessoa consome a menor quantidade de energia para se adaptar ao ambiente em que está.

Outro exemplo é a Academia de Ciências da Califórnia, em São Francisco, nos Estados Unidos. Lá, a colocação de telhados verdes, cobertos de vegetação, tornou o prédio um dos maiores espaços passivamente ventilados de todo o país. Desse modo, quase não há a necessidade de ar-condicionado, assim como em Noomdo. 

No Brasil, esse tipo de arquitetura também é muito bem-vinda. É preciso considerar, porém, que, em um país de dimensões continentais, cada região tem a sua própria necessidade. No Nordeste, por exemplo, onde há bastante ventilação natural, seria necessária a construção de casas leves. Já no Sul do país, onde predominam as temperaturas mais baixas, os edifícios precisam de isolamento térmico. 

No Brasil, por ser um país tropical com clima predominantemente quente, a sociedade se acostumou a se preparar para o calor, mas é preciso ir além. De acordo com a professora do Departamento de Projeto, Expressão e Representação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, Joara Cronemberger, os brasileiros precisam se tornar experts no assunto, pois o país não passará ileso pelas transformações climáticas.

 ”Os edifícios não são dissociados das cidades, e elas, portanto, são parte do problema e configuram um caminho importante para as soluções. Devemos melhorar as cidades com mais áreas verdes, que proporcionam sombra e bem-estar, planejamento para proporcionar áreas de trabalho próximo das áreas onde as pessoas moram e uma diminuição do uso de transporte individual. Essas medidas seriam excelentes pontos de partida", disse.

A busca pelo conforto térmico é uma necessidade antiga na história da humanidade. É o caso dos povos ancestrais do Oriente Médio, por exemplo, onde o clima quente e desértico levou à invenção do chamado badgir, espécie de construção arquitetônica que funciona como uma chaminé que leva o ar quente para cima e o dissipa. Já a população do Egito Antigo, por sua vez, tinha o costume de molhar tapetes com água e colocá-los na entrada de ar da casa, fazendo com que o ar quente ficasse mais fresco naturalmente.

Um dos grandes desafios na construção arquitetônica pensada para o calor é o fato de que, dentro de uma mesma cidade ou região, há lugares que precisam de mais atenção para atingir o conforto térmico. É o que acontece com bairros de baixa renda, que costumam ter menos árvores, levando a uma temperatura mais elevada devido à falta de sombras. 

Para a professora associada da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Márcia Rebouças Freire, o papel da arquitetura é essencial quando a questão é a adaptação ao clima. "O aproveitamento da ventilação e da iluminação natural nas edificações sempre foram premissas básicas da arquitetura. Infelizmente, nos distanciamos disso nas últimas décadas. O uso indiscriminado do condicionamento artificial tem deixado a boa arquitetura em segundo plano”, afirmou.  

“No momento atual, diante do evidente aquecimento global, entramos numa cilada. Por um lado, o calor excessivo nos incita ao uso cada vez mais intenso do ar-condicionado nas edificações. Por outro, esse condicionamento artificial contribui ainda mais para o aquecimento global, devido ao aumento das emissões de carbono, além de aumentar as desigualdades entre aqueles que podem e os que não podem pagar por isso”, concluiu Freire.

Há diversos obstáculos para a manutenção do conforto térmico em tempos de aquecimento global. Nesse cenário, a arquitetura é essencial para ajudar a preservar o bem-estar, seja em escolas e orfanatos, seja em casas e no ambiente de trabalho. Dentro do ambiente urbano, especialmente, ela ganha renovado interesse pelo seu poder de melhorar a qualidade de vida dos cidadãos – algo que será cada vez mais essencial conforme o planeta esquenta.

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Sabrina Brito
Sabrina Brito
Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP
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