29.2.2024

Mudança do clima faz baleias migrarem em direção a rotas de navios no Ártico, mostra estudo

À medida que o gelo diminui e o tráfego de transportes marítimos aumenta, as chances de incidentes de colisão com baleias aumentam

Escrito por
Luana Neves
fotografia
Oferecido por
Baleia preta e branca nadando em um mar azul
Foto:
Todd Cravens/ Unsplash
A preservação das baleias no meio ambiente é fundamental por atuarem como sumidouros de carbono nos oceanos

No Ártico, onde os mares de Bering, Beaufort e Chukchi se encontram, um fenômeno preocupante está alterando a vida de mamíferos que transitam nesta região. Segundo um estudo realizado por cientistas do Instituto de Mamíferos Marinhos da Universidade Estadual de Oregon, as mudanças climáticas estão impactando os locais de alimentação e as rotas migratórias das baleias-da-Groenlândia.

A pesquisa, publicada na revista Geophysical Research Letters, revelou que a mudança dos padrões de migração das baleias, combinada com uma ampliação no número de navios e embarcações, pode causar um aumento dos riscos de colisões entre os animais marinhos e as embarcações comerciais. 

Os pesquisadores monitoraram estes animais aquáticos por 14 anos, entre 2008 e 2022, utilizando um microfone subaquático para recolher dados acústicos e entender as suas rotas de migração.

Os dados mostraram que historicamente essa população de mamíferos passava o inverno no Mar de Bering, localizado entre a Rússia e o Alasca. Em abril, durante a primavera, iam para os mares Chukchi e Beaufort, ambos ao norte de Bering, para se alimentar no verão. Em seguida, voltavam ao estreito novamente em meados de novembro.

No entanto, o estudo concluiu que as baleias estavam deixando o local de alimentação seis semanas mais tarde em 2022 do que em 2008 e que algumas delas não se preocupavam em regressar ao local de inverno, permanecendo mais tempo na área onde há o encontro das rotas de navios.

Desde 2009, o transporte marítimo no oeste do Mar de Chukchi registrou um aumento de 13%. Até o momento, não houve relatos de aumento nos incidentes de colisão que tenham sido registrados. 

 “À medida que o gelo marinho diminui, o transporte marítimo, especialmente os grandes navios comerciais que viajam mais rápido do que os barcos de pesca menores, só vai aumentar”, afirmou a cientista marinha do Instituto de Mamíferos Marinhos da Universidade Estadual de Oregon que liderou o estudo, Angela Szesciorka.

Uma solução, segundo a pesquisadora, seria estabelecer limites de velocidade no habitat sazonal das baleias-da-Groenlândia, reduzindo o risco de colisões com navios e poluição sonora.

Mudança em cadeia

À medida que as águas aquecem e a extensão do gelo diminui, toda a cadeia alimentar do Ártico é forçada a mudar, desde o minúsculo plâncton e o krill até às baleias. 

Ainda que os cientistas não saibam se as alterações climáticas são o motivo por trás dessa mudança no padrão de migração, eles desconfiam que ela seja causada pelo aumento da disponibilidade de alimentos no Mar de Chukchi, como resultado do aquecimento das águas e do declínio do gelo marinho.

“As mudanças que estamos observando nos padrões de migração levantam muitas questões”, disse Szesciorka. “Quantas baleias vão para o Mar de Chukchi no verão? Do que elas estão se alimentando? Os mesmos indivíduos retornam todos os anos? Estamos essencialmente aprendendo em tempo real como as baleias estão respondendo às mudanças climáticas.”

Futuro de culturas tradicionais

Essas descobertas também levantam preocupações sobre o futuro das comunidades indígenas que dependem destes mamíferos para se alimentar.

As baleias-da-Groenlândia podem acabar abandonando partes de suas áreas de distribuição históricas, deixando algumas tribos sem acesso a esse recurso. Para a cientista, ter o envolvimento dessas comunidades no manejo das baleias é fundamental.

Preservação e ameaças

Embora tenham sido caçadas até quase sua extinção de 1700 até o início de 1900, pesquisas de 2019 indicaram que a quantidade de baleias-da-Groenlândia quase quadruplicou desde 1978 e pode ter alcançado ou ultrapassado a população existente antes da caça comercial.

A preservação delas no meio ambiente é fundamental por atuarem como sumidouros de carbono nos oceanos, ao reduzirem a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera e contribuindo para o combate às mudanças climáticas.

Apesar da grande importância para a sobrevivência dos indivíduos, elas ainda são afetadas por atividades humanas. As alterações no clima têm causado o aquecimento das águas e o derretimento dos gelos, levando a uma mudança de dieta e de reprodução destes animais.

Um estudo da Nature revelou que as baleias-francas no Oceano Antártico, por exemplo, estão mais magras do que de costume, ocasionado pela falta de disponibilidade do alimento preferido delas, o krill.

De acordo com os pesquisadores, isso é ruim pois, dessa forma, as mães não conseguem alimentar os filhotes, fazendo com que a população de baleias-francas cresça mais lentamente do que de costume.

Tudo isso expõe como as mudanças climáticas têm tido um grande peso na preservação destes animais marinhos, mas ainda é incerto como se dará a adaptação delas a essa nova situação.

“Vimos estas mudanças nos padrões de migração em apenas nove anos”, disse ela. “Para uma espécie que pode viver até 200 anos, isso é bastante gritante. Isso mostra que eles podem se adaptar aos seus ambientes em mudança por enquanto. Mas chegará um ponto em que eles não conseguirão mais se adaptar? Nós temos que esperar e ver”, disse Szesciorka, da Universidade Estadual de Oregon.

Gostou das histórias que você viu por aqui?

Inscreva-se para ficar sempre em dia com o melhor do nosso conteúdo
No items found.
escrito por
Luana Neves
Luana Neves
É estudante de jornalismo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e estagiária no Nosso Impacto
fotografado por
Luana Neves
voltar ao topo